Prática herdada do avô beneficia aliados com salários vultosos na Prefeitura de Salvador
Entre familiares e amigos – e amigos de amigos, e parentes de amigos… -, os dois mandatos de ACM Neto (UB) como prefeito de Salvador renderam cargos para pelo menos 17 pessoas, por meio de um velho conhecido dos Magalhães: o nepotismo. Cargos esses que, na maioria, continuam garantidos, enquanto alguns novos são atribuídos, uma vez que tal ‘prática’ faz parte da herança carlista e continua sendo realizada por Bruno Reis (UB) na gestão. PUBLICIDADE
A prática do nepotismo na família não é nova – já era bem conhecida pelo ACM avô, por exemplo -, mas se agrava mais e mais a cada ano de gestão. Em uma entrevista recente à Rádio Metrópole, ACM Neto afirmou que, caso ganhasse a eleição para governador da Bahia este ano, iria cortar o número de cargos de confiança do Estado. “Nós vamos proibir a nomeação de 20% logo de cara”, afirmou, mas o histórico dele como prefeito e o legado de atribuições de cargos mostram grande incoerência – para não dizer demagogia – com o tema.
A Secretaria do Governo (Segov) é a preferida de Neto para colocar os coligados familiares, assim como o cargo favorito é o de assessor especial, e o salário, na maior parte, beirando R$ 20 mil – já com os descontos. Um desses é o primo do ex-prefeito, Ângelo Mário Peixoto de Magalhães Neto, assessor especial da Segov desde 2014, que recebeu exatos R$19.452,33 na folha de pagamento do último mês.
E não para por aí. Um outro assessor especial da Segov, Bruno Oitavan Barral, empregado por Neto e que, dizem, nem chega realmente a aparecer no trabalho, abocanha salário de mais de R$ 17 mil. Outro beneficiado é o primo de Claudio Tinoco (ex-secretário de Cultura e Turismo de Salvador), Alexandre Almeida Tinoco, que hoje ocupa o cargo de diretor geral de fiscalização da Secretaria Municipal de Desenvolvimento e Urbanismo (Sedur), com um salário que passa dos R$ 20 mil.
Cláudio Tinoco tem primo empregado com salário de R$ 20 mil| Foto: Divulgação / CMS
Irmãos, mãe, pai
Mas tem ainda aqueles que não são meros amigos ou primos de alguém, como é o caso da irmã de Leur Lomanto (União Brasil), diretora geral da Secretaria Municipal de Desenvolvimento, Emprego e Renda (Semdec), Maria Eduarda Gordilho Lomanto, com vencimentos de R$ 17 mil. A mãe deles não ficou de fora: Claudia Wense Gordilho recebe mais de R$ 5 mil por mês para ser mais uma assessora especial da Segov.
Ainda tem o pai de Kiki Bispo, o ex-titular da Secretaria Municipal de Promoção Social, Combate à Pobreza, Esportes e Lazer (Sempre), Everaldo Bispo, que é assessor especial de política ambiental da Secretaria Municipal de Sustentabilidade e Resiliência (Secis) desde 2015, embolsando R$ 9 mil de salário. https://3ecab731a2ad90a72ad042298c0915af.safeframe.googlesyndication.com/safeframe/1-0-38/html/container.html
Assessor especial de política ambiental da Secis, Everaldo Bispo embolsa R$ 9 mil de salário| Foto: Divulgação
Construtor
E, claro, não podemos esquecer de Lucas Cardoso, apontado pela Odebrecht como operador de propinas durante as campanhas de ACM Neto para prefeito e dono da construtora BSM, que ganhava toda licitação de obra na cidade que quisesse fazer, mesmo que o valor estipulado fosse o mais alto.
O pai de Lucas, Manfredo Pires Cardoso, é nada mais nada menos que o gerente de projetos estratégicos da Casa Civil, cargo pelo qual recebe um polpudo salário nos parâmetros da folha municipal, da ordem de mais de R$ 21 mil. E a lista a partir daí só cresce.
E a lista segue recheada de parentes, amigos, amigos de amigos e “coligados” de variados matizes: Misael Aguilar Silva Neto (R$ 23.5 mil de salário), filho do ex-prefeito de Juazeiro Misael Aguilar; Geraldo Gentil Magalhães Pinto (R$ 23.5 mil) e Gustavo Teixeira Moris (R$ 20 mil), familiares do ex-prefeito; Edylene Lopes Ferreira (R$ 10.5 mil), correligionária política de Serrinha; Euvaldo Jorge Miranda de Oliveira Júnior (R$ 11.4 mil), filho do ex-vedreador Euvaldo Jorge; Antonio José da Cruz Júnior Magalhães (R$ 23,5 mil), filho da ex-prefeita de Candeias Tonha Magalhães; Ana Pierina de Araújo Viana (R$ 22,7 mil), pessoa bem ligada ao ex-vereador Pedro Godinho, entre outros.
Tentamos obter resposta da assessoria de ACM Neto, que segue sem atender ou retornar os contatos feitos por A TARDE, que fica à disposição para receber as devidas informações e esclarecimentos a respeito das informações publicadas.
Lucas Cardoso foi apontado pela Odebrecht como operador de propinas durante as campanhas de ACM Neto para prefeito| Foto: Reprodução | Redes Sociais
ACM teve nove familiares diretos nomeados na Bahia
Um levantamento feito pelo jornal Folha de S. Paulo em abril de 1999 – curiosamente conduzido por um atual integrante da campanha de ACM Neto ao governo do estado –, mostrou como a prática do nepotismo é uma marca das gestões carlistas na Bahia.
Na época, o então senador Antônio Carlos Magalhães buscava instaurar uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) contra o nepotismo no Poder Judiciário – mas na Bahia, o levantamento da publicação mostrou que nove familiares diretos de ACM, incluindo o atual candidato a governador ACM Neto, tinham sido nomeados para cargos públicos em áreas sob influência dele: o governo do carlista Paulo Souto, a prefeitura de Salvador e o Judiciário baiano.
“São todos os cinco irmãos, uma filha, uma sobrinha e dois netos (entre eles, ACM Neto)”, informava a publicação. Três dos cinco irmãos ocupavam cargos nomeados pelo governador. O médico José Maria de Magalhães Neto era o secretário estadual da Saúde. Ângelo Magalhães era diretor financeiro do banco estatal de desenvolvimento, à época chamado Desembanco. Já a bióloga Helena Magalhães era assessora especial da Secretaria Estadual da Educação.
O então governador Paulo Souto também foi o responsável pela nomeação de um quarto irmão, o advogado Eduardo Jorge Magalhães, como desembargador. O outro irmão de ACM, Jayme Magalhães, era o chefe de gabinete do prefeito de Salvador.
Os filhos de ACM também estavam contemplados pelo poder público. Presidente da Rede Bahia já naquela época, o primogênito, Antônio Carlos Magalhães Júnior, era suplente do pai no Senado – e assumiria a cadeira em junho de 2001, após o senador renunciar ao cargo, por causa da repercussão do escândalo da violação do painel de votação do Senado. Já a filha Tereza Mata Pires coordenava o Serviço de Atendimento ao Cidadão (SAC) na Bahia.
ACM Neto, com 20 anos à época, era o chefe de gabinete da Secretaria Estadual da Educação. Chamou atenção a rapidez com que o salário do atual candidato a governador cresceu: “Ele foi contratado em janeiro e um mês depois ganhou uma promoção de 186% no salário-base”, informou a reportagem.https://3ecab731a2ad90a72ad042298c0915af.safeframe.googlesyndication.com/safeframe/1-0-38/html/container.html
“Nepotismo atrapalha o País”, diz jurista
O fato é que, desde 2008, por meio da 13ª Súmula Vinculante, o Supremo Tribunal Federal (STF) consolidou o entendimento de que a contratação de parentes de até terceiro grau em cargos de confiança está proibida nos três poderes (nas esferas federal, estadual e municipal).
Ignorar a lei, mesmo com uma legislação fortificada nesse sentido, explica o advogado André Torres, do escritório André Torres Advogados Associados, é muito fácil e muito praticado por todo o Brasil. “E isso atrapalha muito o País, que está longe de trabalhar na linha do mérito. A legislação vem melhorando isso e até ouvimos falar de um lugar ou outro onde ações contra o nepotismo foram aplicadas com sucesso. Mas não é raro que, com o passar do tempo, a prática comece a voltar. É um problema que permeia a ética do povo brasileira, então se torna uma questão de educação e fiscalização. Legislação temos, o que falta é instrução para usar as ferramentas”, explica o advogado.
O vereador Silvio Humberto (PSB) ressalta que a proibição do nepotismo é uma exigência constitucional e que essa prática “fere de morte” aquilo que chamamos de República. “Quando você nomeia parentes, contraria preceitos constitucionais e tende a ferir de morte o ser republicano, então [a prática] deve ser condenada e tem que ser execrada do nosso dia a dia. A continuidade viola os princípios democráticos, e é por isso que temos que continuar defendendo o concurso público. O nepotismo é condenável, acima de tudo se nós queremos continuar reafirmando os valores da democracia e os valores republicanos”, aponta o vereador.
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